quinta-feira, 28 de abril de 2016

Carta aberta ao senhor Presidente da República


Exmo. Senhor,

Presidente da República, Professor Marcelo Rebelo de Sousa,

Não votei em V. Excelência, mas considero-o meu legítimo presidente da República e de todos os Portugueses porque foi eleito por maioria absoluta.

Quase dois meses depois da tomada de posse está na hora de mostrar que não basta a fama, a “distinção e louvor”, os títulos, a cátedra e outras honrarias para ser um bom “Chefe de Estado” e “garantir o normal funcionamento das instituições democráticas”. Um bom Chefe de Estado não pode limitar-se a gerir o expediente como um “despachante oficial”, com autoridade acrescida, que assina, promulga, comemora, inaugura, está presente, sorri, recebe palmas, abraços e beijinhos, mostra-se e apela a estabilidade mesmo que a situação económica e social do país ameace, precisamente o contrário. Não se pode tapar o sol com uma peneira. Está na hora de o povo exigir verdadeira democracia, honestidade e competência a todos os órgãos de soberania, às instituições e seus responsáveis que comandam os destinos do país.

Não basta fazer promessas, é preciso cumpri-las. Basta de discursos, de ideias e intenções, é preciso acção.

O conceito de democracia assenta no princípio de que o partido ou a força política, mais votada nas urnas, deve governar. Basta um voto a mais para que um partido seja declarado vencedor, por maioria simples, por ter obtido mais votos do que qualquer outro partido, isoladamente. Se a Constituição da República Portuguesa não defende este princípio, então, não defende a democracia. Não pode haver uma maioria nas urnas e outra maioria diferente, no Parlamento. A maioria democrática resulta do veredicto popular soberano, expresso pelo voto nas urnas e não duma batota da soma de alguns partidos minoritários vencidos. Uma coligação pós-eleitoral, de partidos minoritários derrotados individualmente nas urnas, é uma traição ao veredicto do povo. A chamada “democracia parlamentar” não é mais do que uma anarquia oficial mascarada de legitimidade que favorece o oportunismo, a ganância pelo poder e a incompetência. A verdadeira democracia não se confunde com a indefinição e o pluralismo das meias tintas, onde vale tudo e nada tem valor porque a verdade é trocada pela falsidade. O Parlamento é, actualmente, o espaço da inutilidade, da ineficácia, da incompetência e da impunidade de quem destrói o país, a economia, a sociedade e as gerações futuras. O Parlamento é, hoje, dominado pela maioria da mediocridade, da mentira, da falsidade e do parasitismo político.

Esta anarquia ou falsa democracia, assente num Parlamento que funciona à revelia da vontade popular em que vivemos há algumas décadas, tem favorecido o oportunismo, a demagogia e arruinado o país, levando-o várias vezes à bancarrota, sacrificando o povo com uma carga fiscal cada vez mais penosa, e ameaça piorar ainda mais, no presente, com um primeiro ministro que não tem competência nem legitimidade democrática. Perdeu as eleições e tomou de assalto o poder, tendo tomado uma atitude semelhante na liderança partidária. O seu programa político segue linhas ideológicas que já deram provas claras de insucesso, de gestão danosa e de irresponsabilidade.

O senhor presidente, enquanto professor catedrático de Direito, alguma vez aprovou algum aluno, cábula, que, tenha somado a negativa que teve no exame, um sete, com as negativas de mais dois colegas, um cinco e um quatro, por exemplo, para lhe dar um “Muito Bom” – dezasseis? Alguma vez terá reprovado um aluno que se tenha esforçado minimamente e tenha conseguido um dez, no limite do nove e meio? Toda a gente sabe que uma nota negativa no exame obriga a que o aluno vá à segunda chamada ou seja obrigado a repetir a cadeira, mas nunca poderá somar negativas para obter uma positiva. Se nenhum professor permite uma fraude destas, em qualquer nível de ensino, por que razão o Presidente da República, o mais alto magistrado da Nação, pode tolerar uma batota deste calibre? As coisas da política, do governo, da democracia, da gestão dos destinos da vida de milhões de portugueses, da soberania do voto e da dignidade do povo são de somenos importância e valem menos do que uma nota de Direito, de Português, de Biologia ou de Matemática? Onde está o respeito dos políticos, da classe política em geral, para com o povo que os elege?

Está na hora de o povo exigir uma verdadeira democracia, séria, exigente e transparente para que uma maioria alcançada nas urnas possa levar o mandato até ao fim, sem percalços, e para que o povo possa, depois, avaliar o seu desempenho. (É por isso que o povo desacredita os políticos e diz que são todos iguais) Está na hora de o povo exigir, também na política, qualidade em detrimento da quantidade.

É tempo de acabar de vez com a impunidade e a irresponsabilidade. Se o primeiro ministro, que assumiu o poder de forma ilegítima e prepotente, prometeu “virar a página da austeridade”, “aumentar o rendimento das famílias”, “baixar os números do desemprego”, criar desenvolvimento, desenvolver a confiança na economia, etc., mas aumentou os impostos, subiu e continua a subir o preço dos combustíveis e o custo de vida de forma generalizada, fazendo precisamente o contrário do que aquilo que prometeu, criando mais pobreza, mais precariedade e mais endividamento, como é que este primeiro ministro pode ter alguma credibilidade e como é que ele pode assumir a sua responsabilidade perante o povo e os outros órgãos de soberania, perante toda a gente? Onde está a responsabilidade e a honestidade deste primeiro ministro? A culpa vai ser mais uma vez dos outros? Vamos tolerar mais uma vez esta gravíssima chocante impunidade e que a austeridade sacrifique ainda mais o povo?

O que vale apelar à estabilidade e ao consenso quando o próprio governo é o exemplo de instabilidade e desentendimento, que se desagrega de dia para dia e que se apoia em partidos que seguem ideologias retrógradas e perversas, incapazes de governar e assumir a responsabilidade pelos seus actos?

O que vale um programa de estabilidade se o país está cheio de instabilidade, de falências, de pobreza, de desemprego, de fome, de violência, de descontentamento e de insatisfação?

O que vale fingir que vivemos em cima de um tapete ou almofada confortável que esconde os enormes buracos do caminho, se o país político é cada vez mais um campo minado de armadilhas e precipícios devido à incompetência e à ingenuidade de quem governa?

Senhor presidente da República, por que espera para demitir este governo, já, de forma incondicional?

Apresento a V. Excelência os meus cumprimentos.

27-04-2016

António de Jesus Oliveira