quinta-feira, 31 de dezembro de 2009

Na hora do recreio III

Trabalho de grupo
- Vamos lá trabalhar, meus meninos.
- O que é que eu faço senhora professora?
- Tu, menino Sócas? Não sabes que estás no grupo do governo?
- Ah! Pois é! Eu estava distraído, senhora professora!
- Cada grupo tem que fazer o desenho mais bonito para o país, está bem? Vamos lá…
- O meu grupo já fez este rascunho na campanha eleitoral, senhora professora!
- Está bem, menino Sócas! Vamos lá, depressa, temos muitos problemas para resolver!
- “Não gosto desse desenho! Nhã! Nhã! Nhã! Nhã!”
- “Esse desenho é uma porcaria! Bahhhhhh!”
- “Esse desenho não vale nada! Uhhhhhh! Os nossos desenhos, todos juntos, valem muito mais!”
- Ó senhora professora, todos os outros meninos da oposição estão a desestabilizar o nosso programa!
- A desestabilizar o programa, menino Sócas?
- Sim! Eles não nos deixam governar!
- Vá lá, menino Sócas, tens que dialogar com os outros meninos! Está bem?
- Eu não sei dialogar, senhora professora!
- Tens que aprender, menino Sócas. Estás mal habituado!
- Ó senhora professora, o nosso presidente não diz nada, está sempre calado, sempre calado!… ele tem muitas competências!
- O que é que querias que ele dissesse, menino Vitinho?
- Que desse estabilidade, senhora professora!
- Deixa lá, um dia o nosso presidente vai falar, menino Vitinho. Parece-me que essas Notas Soltas estão muito desafinadas!
- Nós vamos fazer o nosso desenho favorito, o melhor, senhora professora! Já está aprovado em Conselho de Ministros!
- Qual é o vosso desenho favorito para vencer a crise e o desemprego, menino Sócas?
- É aquele em que os gays brincam uns com os outros, senhora professora!
- Atenção meninos, o nosso presidente vai falar!
- “ O casamento gay não é prioridade. É preciso resolver o problema da fome, do emprego e da produtividade.”
- O que foi menino Pinto? Porque é que estás com essa cara de zangado?
- Ó senhora professora, o presidente está a interferir na agenda do PS. Ele não pode fazer isso. É um malvado!
- Que berraria é essa, meninos da oposição?
- Ó senhora professora, o nosso presidente não disse nada de errado! O PS é que está sempre com queixinhas e não quer governar. Só quer jogar à macaca!
- Pois é!
- É isso mesmo!
- Eu quero falar, senhora professora.
- O que é menino Sócas?
- Tenho amigos muito bons que me ajudam a criar muita barafunda no país a quem quero dar um louvor muito especial: o menino Vitinho, o menino Pinto e o menino Rodriguinho. Eles são muito bons a bater no presidente e na oposição e a defender o casamento gay!
- Quero ver esses trabalhos feitos depressa, meninos. O país está em crise!
- Ó senhora professora, o presidente está a fazer o jogo da oposição e assim não podemos fazer nada.
- Porquê, menino Sócas?
- Ele aprovou o adiamento do Código Contributivo! Não podemos fazer nada, senhora professora!
- Foi aprovado pela oposição, menino Sócas! Eles são a maioria.
- Mas eu queria gastar mais dinheiro, muito dinheiro e pôr o país todo ingovernável e sacar mais dinheiro do bolso dos portugueses, em impostos, e a oposição não me deixa!
- Tu não queres governar menino Sócas. Estás a portar-te mal... Queres seguir o princípio de “quanto pior, melhor”. Não é menino Sócas?

sexta-feira, 25 de dezembro de 2009

Feliz Natal

Feliz Natal e um Bom Ano de 2010 para todos.





quarta-feira, 16 de dezembro de 2009

Na hora do recreio II


As queixinhas do menino Sócas
- O que é que se passa, menino Sócas? Estás a brigar com os outros meninos?
- Não! Eles é que são maus e estão todos contra mim!

- São maus? Não quero aqui meninos maus! Ai! Ai!... Ai! Ai!...

- Ó senhora professora, mas eles juntaram-se todos contra mim, da esquerda à direita e não me deixam jogar! Isto nunca se viu em lado nenhum!

- Não te deixam jogar ou tu não queres?

- Eles é que não me deixam…

- Não me estás a dizer a verdade, menino Sócas! Tu é que nos meteste, a todos, num grande pântano e agora queres arranjar uma desculpa para fugires, não é?

- Não, senhora professora.

- Vamos lá a ver menino Sócas, que jogo é esse?

- Não sei, senhora professora. Eles foram todos para o Parlamento e eu fiquei aqui sozinho no governo…

- Então esse não é o jogo democrático, menino Sócas? Não sabes como se joga?

- Não sei lá muito bem, senhora professora! Eu sempre fiz o que quis! E agora também quero mandar em tudo…

- Mandar em tudo? Não sabes que não tens maioria absoluta?

- Mas o senhor Presidente devia dar-me uma ajudinha e dizer aos deputados que façam, todos, o que eu mando!...

- Que façam o que tu mandas?

- Sim, senhora professora. Eu ganhei e sou o maior!

- Então tu queres uma "Assembleia Nacional" como antigamente?

- Sim... Não... Não sei, senhora professora. Nunca soube bem o que quero!

- Ó menino Sócas, o senhor Presidente está em Belém, não está na Ajuda nem em S. Bento!

- Eu sei, senhora professora. Mas agora dava-me muito jeito uma pequena Ajuda!

- Não foste tu, menino Sócas, que acusaste o senhor Presidente de interferir no programa eleitoral do PSD e agora queres que ele ponha ordem na Assembleia?

- Eu não posso jogar com dois orçamentos, senhora professora, isto é politiquice…

- Politiquice, menino Sócas? Não sabes que no jogo democrático é o governo que tem que se submeter à Assembleia e não o contrário?

- Mas eles estão a esticar, a esticar a corda… parece que me querem enforcar…

- Eles são os legítimos representantes do povo, menino Sócas!

- Podiam só fazer de conta que representam o povo e deixarem-me em paz!

- Fazerem de conta? Fingirem, menino Sócas? Quem foi que disse que cada um devia pedalar a sua bicicleta?

- Mas eu gostava que a Assembleia fosse boazinha para mim e me deixasse fazer tudo! Assim não vou ter dinheiro para pagar as minhas dívidas…

- As tuas dívidas? Não faças estradas e auto-estradas, TGVs e outras obras que não possas pagar!

- Eu só queria arranjar uns empregozitos, senhora professora! Se não fossem as obras que eu mando fazer não podíamos ver tantos camiões de um lado para o outro carregados de terra e pedras. Eu não faço tantas estradas e auto-estradas para ficarem às moscas!…

- Pois não, menino Sócas. Fazem muito jeito aos ladrões que roubam carrinhas cheias de dinheiro e camiões de tabaco para fugirem antes que a polícia os apanhe!

- Ó senhora professora, isso é tudo por causa da crise, eu não tenho culpa nenhuma. Nós nem queremos cá ladrões nem outros criminosos. Já comecei a vender as prisões…

- Já vendeste prisões e computadores Magalhães. Só tens feito trapalhadas e depois queixas-te que o dinheiro não chega, não é?

- Os presos ficam muito caros ao Estado, senhora professora! Os Magalhães são para entreter os meninos e os papás e, assim, não verem as trapalhadas que eu faço. Se ninguém vir, eu nunca fiz nada, porque não há provas!...

sábado, 5 de dezembro de 2009

A face visível do oculto

"Não há fumo sem fogo"

Diz o povo que “não há fumo sem fogo”. No caso “Face Oculta” só se tem visto fumo, tanto fumo que não é possível ver a chama oculta. Havendo fumo, alguém fez fogo. Com certeza que quem investigou, viu o tal “fogo”. Se o “fogo” é, alegadamente, criminoso e atinge os bens de todos (“res publica”), alguém terá que ser responsabilizado.
Entidades judiciais competentes identificaram vários suspeitos e apuraram indícios de crimes ao longo de meses. Diz-se que ninguém está acima da lei mas, neste caso, a impressão visível com que ficamos é que não é bem assim. Analisemos alguns pontos com a ajuda de metáforas:
Primeiro – a validade das provas de investigação: há mais de um século que a investigação médica utiliza o raio X e hoje, processos mais modernos que permitem diagnósticos mais rápidos e verdadeiros. Mesmo assim há doenças de diagnóstico muito difícil.
Não sei que técnicas de investigação criminal se podem equiparar ao raio X ou TAC. Se considerarmos as escutas o “raio X do crime”, uma escuta telefónica, legalmente autorizada para um alvo pode tornar-se ilegal e sem efeito para outro que se colocou em frente? Se um raio X ao estômago permite ver um tumor no fígado, o médico manda o doente para casa dizendo-lhe que está de boa saúde porque o raio X era para o estômago e não para o fígado?
Segundo – o problema da privacidade: se um cidadão, candidato em campanha eleitoral, sai da sua privacidade, mostra-se, apela ao voto, compromete-se com o país, arrebata multidões, implora ao povo, entra-nos dentro de casa e da consciência, percorre cidades, vilas, aldeias, praças e avenidas a apregoar as suas ideias, se esse candidato sair vencedor como primeiro-ministro pode, eventualmente, na sua vida privada, trocar o interesse geral e nacional por interesses particulares e pessoais, servindo-se do poder que lhe foi conferido por todos? Uma figura pública de primeira grandeza pode agir e tomar decisões como um cidadão vulgar e alegar que aquilo que faz é meramente privado? Pode o pastor assaltar o redil durante a noite? Um primeiro-ministro é-o apenas em algumas horas do dia (em part time) ou no dia todo? O compromisso solene da tomada de posse (Juro por minha honra…) abrange apenas o equivalente ao horário de um funcionário público: da 9-12,30 – 14-17,30?
Pode um responsável máximo pelos destinos do país ser considerado, por uma entidade judicial competente, alegadamente, suspeito de “atentar contra o estado de direito”, em segredo, e desculpar-se que o que faz diz respeito apenas à sua vida privada, em assuntos que, porventura, digam respeito a todos, e ninguém tem o direito de saber e pedir responsabilidades? Pode o poder oficial deixar de o ser e negar-se à transparência perante todos os cidadãos com quem estabeleceu um compromisso? Essa transparência inerente ao exercício da democracia não impõe limites à privacidade de quem exerce funções de comando?
Além destas, muitas outras questões surgem, visivelmente, do oculto, tal como outros aspectos que tornam nebulosa e desacreditada a acção da Justiça, surgindo aos olhos dos cidadãos uma sequência de suspeições: um juiz considera existirem indícios graves de crime o outro conclui que nada de mal se passa. Aos olhos de um juiz os investigadores agiram legalmente, aos olhos de outro, ilegalmente. Onde está a verdadeira voz da Justiça? Onde está a independência e a unanimidade de critérios da Justiça? Não estará a Justiça a branquear um alegado crime político?
O “fumo” é a ponta do iceberg que a Justiça parece procurar manter oculto ou ignorar. As vozes críticas que, nos últimos dias, têm vociferado contra a corrupção podem ser entendidas como um aviso à navegação. Há quase cem anos o Titanic foi ao fundo, parece-me que desta vez, com o barco há largo tempo em ruína, o piloto não fará melhor.